quarta-feira, 1 de maio de 2013

A questão das piscinas da Fonte Nova - II



Assunto: O acórdão do Tribunal de Contas (11-12-2012) sobre a questão das piscinas da Fonte Nova

 II– Fundamentação e decisão

O Tribunal de Contas não se pronunciou somente sobre a minuta, mas sobre todo o processo que envolveu a construção das piscinas e que, resumidamente, antes apresentámos.
No que respeita à decisão do Tribunal de Contas, ela incide sobre seis pontos, fundamentando-se a sua apreciação na legislação aplicável a cada caso. Resume-se, a seguir, a apreciação que o Tribunal de Contas proferiu sobre cada um dos pontos:

1.           A decisão de constituição de parceria público-privada institucional e sua fundamentação
a.    Não existe, no processo, uma fundamentação consistente, baseada em estudos e na ponderação dos custos e dos benefícios, de lançar um procedimento de formação de uma PPPI; tudo o que há são afirmações genéricas, sem demonstração;
b.    Não existe qualquer evidência documental que permita elucidar a forma como foram repartidos os riscos entre os parceiros público e privados;

Em conclusão: “Deficientíssima fundamentação pois, para a complexidade e dimensão do processo, desadequada avaliação das capacidades financeiras disponíveis e com tão negativos resultados, sobre os quais este Tribunal não pode deixar de formular um claro juízo desaprovador”.


2.           A constituição do direito de superfície sobre o terreno
a.   A constituição do direito de superfície a favor da sociedade a criar no âmbito da PPPI não constava nos documentos de procedimento que lhe deu origem;
b.   Não tendo sido publicitado, não foi assegurada a informação sobre um aspeto fundamental do negócio aos potenciais interessados;
c.    Na decisão do Tribunal de Contas, o procedimento não foi considerado equitativo, transparente e concorrencial e os documentos do concurso padecem de uma grave falta de rigor.

3.           O recurso ao financiamento externo através da parceria
a.   A responsabilidade pelo risco, no que respeita ao financiamento, foi toda assumida pelo parceiro público, sobretudo pela Câmara Municipal, através da carta-conforto, e dos montantes que se comprometeu a pagar mensal e anualmente ao longo de 20 anos e que depois passou para 30 anos, na minuta de abril de 2011.
b.    “Em conclusão, pese embora o quadro legal aplicável e o quadro contratual estabelecido, efetivamente os parceiros privados da parceria nada pagaram e nenhum risco correram.” “Assim, o procedimento, neste concreto domínio também não foi equitativo, transparente e concorrencial.” “E acrescente-se: os parceiros privados não só não incorreram em qualquer risco no que respeita ao financiamento, como também (…) em matéria de exploração. “

4.           A cedência da exploração do complexo das piscinas
a.    Nos estatutos aprovados e que acompanham a escritura de constituição da Campiscinas, diz-se no artigo 3º que o objecto da sociedade consiste na implementação, construção e manutenção de infra-estruturas e de equipamentos sociais, desportivos e de lazer e prestação de serviços relacionados com a actividade.
b.    Constituiu uma alteração relevante do quadro inicial estabelecido para a formação dos contratos atribuir à Campiscinas a exploração das piscinas;
c.     “Assim, o procedimento, neste concreto domínio também não foi equitativo, transparente e concorrencial.”
d.    “Mas a questão deve ser ainda vista noutra perspetiva: acontece que a Campiscinas pretende transmitir à CampoMayor a exploração das piscinas, que estava excluída do objecto do procedimento de formação do contrato de sociedade que lhe deu origem e ficou também excluída do objecto da sociedade depois constituída.”
e.    “Em linguagem corrente diga-se que pretende transmitir o que não tem.”
f.     “Tendo em conta o disposto no artigo 44º nº 3 alínea a) da Lei da Organização e Processo do Tribunal de Contas, evidencia-se por isso um motivo legal claro – nulidade da transmissão pretendida – para recusar o visto à minuta contratual agora em apreciação.”

5.           O nível de publicitação feita no procedimento de formação de PPPI para executar uma obra pública mediante recurso ao financiamento através de entidade bancária
a.   Na construção das piscinas e sua posterior manutenção podiam ter sido adotadas, pelo Município de Campo Maior ou pela empresa municipal, soluções tradicionais de contratos de empreitada, de empréstimo para investimento de médio e longo prazo, bem como aquisição de serviços para manutenção dos equipamentos, sujeitas aos princípios e regras de contratação pública;
b.   Pela solução adotada, o Município de Campo Maior não observou os princípios e regras fixados na Lei das Finanças Locais, em matéria de contração de empréstimos para a realização de investimentos;
c.    “Sem ter procedido aos estudos e fundamentações necessárias ao lançamento de uma parceria público-privada – como acima se viu – colocou-se em posição de, indiretamente, poder contrair empréstimos e responder efetivamente por eles, sem observar o que dispõe a lei. Com os maus resultados que agora se veem e apesar dos esforços que tenta fazer de sanear a situação criada”.
d.   O facto de a publicitação do procedimento de seleção da entidade privada para integrar a nova sociedade se ter feito através de um anúncio no Diário de Notícias, é particularmente grave, pois, face às entidades contratantes e aos valores envolvidos, deveria ter-se feito a publicitação por via do Diário da República e do Jornal Oficial da União Europeia.
e.    Foi, assim, restringido “o universo de potenciais interessados e concorrentes no procedimento de formação da PPPI em que se insere a minuta de contrato agora em apreciação.”
f.     “Não se observaram pois os princípios da transparência e da publicidade, da igualdade, da concorrência e da proporcionalidade”

6.           A minuta de contrato-promessa de cessão de posição contratual e de cessão de exploração do pavilhão multiusos e o exercício de competências de fiscalização prévia.
a.    “Esta minuta relaciona-se estreitamente com um conjunto de instrumentos contratuais celebrados na sequência de um contrato de sociedade e do procedimento que lhe deu origem…”
b.    “o referido procedimento está ferido de várias ilegalidades que se transmitem aos contratos”.
c.    “Tais ilegalidades prendem-se sobretudo com a violação de regras e princípios a observar nos procedimentos de formação de contratos públicos: transparência e publicidade, igualdade, concorrência, proporcionalidade, boa fé e estabilidade.”
d.    “Tais violações têm impacto direto na definição do universo de pontenciais interessados e concorrentes.”
e.    “Com o procedimento, envolvendo tais violações e tal impacto, produziu-se o resultado financeiro que os autos demonstram. Caso aquelas violações não tivessem ocorrido o resultado financeiro que se teria obtido seria obviamente diferente.” (Valor da empreitada, 3.450.000€ acrescido de IVA, 8.675.000€ valor apresentado na minuta)
f.     “… constitui fundamento de recusa do visto a desconformidade de atos, contratos e demais instrumentos sujeitos a fiscalização prévia com as leis em vigor que implique nulidade e/ou ilegalidade que altere ou possa alterar o respectivo resultado financeiro.”
g.    “… a gravidade de violações contratadas no procedimento de formação da parceria é tal, que não é exagerado afirmar-se que tal alteração não se limita a ser uma possibilidade, estando-se mais no território das fortes probabilidades e das certezas.”
h.   Em consequência, O TRIBUNAL DE CONTAS RECUSA O VISTO DA MINUTA DO CONTRATO

Acrescente-se o que, no Acórdão do Tribunal de Contas, a propósito da responsabilização pelas ilegalidades demonstradas, é claramente dito: “Relembre-se que o não envio de atos e contratos a fiscalização prévia configura uma infracção suscetível de responsabilização financeira sancionatória que, no caso presente, não se manda investigar por se ter desde já em consideração os prazos prescricionais fixados na lei”.